As informações foram divulgadas pelo jornal Valor Econômico, que teve acesso ao despacho encaminhado pelo ministro
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou neste domingo (23) o envio à Polícia Federal das denúncias que apontam possíveis desvios de emendas parlamentares por parte dos deputados Pedro Lucas Fernandes (União-MA) e Zezinho Barbary (PP-AC).
As denúncias foram apresentadas por Transparência Internacional, Transparência Brasil e Contas Abertas, no âmbito da ação que discute a constitucionalidade, a publicidade e o controle do atual modelo de execução de emendas parlamentares — especialmente diante da proliferação de mecanismos paralelos com baixa rastreabilidade.
Despacho cita indícios de crimes e pede apuração imediata
No documento, Dino afirma que os episódios descritos pelas organizações podem configurar ilícitos criminais e demandam investigação urgente.
Segundo ele, “À vista dos fatos noticiados — que configuram indícios de possíveis crimes — encaminhe-se [o material] à Diretoria-Geral da Polícia Federal, para que adote as providências cabíveis”.
A determinação inclui a possibilidade de anexar o material a inquéritos já existentes ou, se necessário, abrir novos procedimentos específicos.
Caso Pedro Lucas: verba para estradas teria pago folha salarial e serviços de rotina
Entre os episódios relatados, está o caso do município de Arari (MA), que recebeu uma emenda de R$ 1,25 milhão indicada pelo deputado Pedro Lucas Fernandes para recuperação de estradas vicinais.
Segundo a denúncia, o dinheiro teria sido usado para despesas de custeio da prefeitura — como folha salarial, coleta de lixo e compra de medicamentos — prática proibida pela Constituição.
Pedro Lucas, líder da bancada do União Brasil, afirmou ao Valor que todos os recursos foram corretamente enviados e que cabe ao prefeito responder pelo uso adequado das verbas. Declarou ainda que, quando notificado, apresentará os esclarecimentos necessários.
O parlamentar é próximo ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e chegou a ser convidado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir o Ministério das Comunicações, mas recusou por pressão partidária.
Caso Barbary: máquinas financiadas por emenda teriam sido usadas em área protegida
As denúncias sobre o deputado Zezinho Barbary dizem respeito ao uso de máquinas compradas com recursos de emendas para abertura irregular de estradas em área de proteção ambiental no Acre.
De acordo com a petição, uma das máquinas teria continuado a operar mesmo após embargo do Ibama, beneficiando familiares do parlamentar. Barbary não foi localizado para comentar.
Entidades apontam risco estrutural das “emendas paralelas”
Em manifestação anexada ao processo, a Transparência Internacional argumenta que os casos ilustram um padrão de opacidade e fragilidade de controle sobre recursos públicos.
Segundo a entidade, a expansão de mecanismos sem rastreamento obrigatório — as chamadas “emendas paralelas” — agrava o risco de mau uso dos recursos. “Há graves riscos de corrupção, descontrole e desigualdades na aplicação dos recursos”, diz a petição.
Desde que assumiu a relatoria do caso sobre o regime de emendas, Dino tem determinado maior rigor na execução orçamentária, exigindo plano de trabalho, rastreamento e transparência integral.
Tensão política cresce após derrota da “PEC da Blindagem”
A ampliação das investigações sobre emendas preocupa parlamentares de diferentes partidos. Em setembro, a Câmara aprovou por ampla maioria a chamada “PEC da Blindagem”, que buscava dificultar investigações contra deputados, sob o argumento de proteger prerrogativas parlamentares.
A proposta, porém, foi rejeitada pelo Senado após forte reação pública, sendo vista como uma tentativa de impedir o avanço de apurações sensíveis — como justamente aquelas envolvendo o uso de emendas.
Com o novo encaminhamento determinado por Dino, caberá à Polícia Federal decidir se abre inquéritos específicos ou se incorpora os fatos a investigações em curso.