Portais do Detran (Departamento Estadual de Trânsito) ainda têm pouca transparência e não divulgam dados fundamentais sobre segurança no trânsito, segundo relatório do Observatório Nacional de Segurança Viária
Fonte: Folha de São Paulo
Em doze estados não há disponibilidade de informações online sobre sinistros, incluindo mortes provocadas por acidente, e onze não têm dados sobre infrações
Além disso, sete Detrans não divulgam estatísticas sobre condutores habilitados e cinco não têm informações sobre a frota de veículos no estado. Os órgãos de trânsito de Roraima, Pará e Piauí tiveram os piores resultados, com notas inferiores a 2,5 em uma escala de 0 a 10.
Procurados, os departamentos dos estados não se manifestaram até a publicação desta reportagem. A Associação Nacional de Detrans, que representa órgãos estaduais de trânsito em todo o país, informou que os estados não haviam recebido o relatório até a última quarta-feira (13) e, sem analisar os dados, não poderiam comentar os resultados.
Na outra ponta do ranking estão Sergipe, São Paulo e Espírito Santo, com notas acima de 8,9. Em comum, os estados com melhor desempenho disponibilizam dados relacionados à segurança viária, conteúdos sobre educação para o trânsito e estatísticas de atendimento ao público.
Segundo Lucas Papais, diretor de atendimento ao cidadão do Detran-SP, o desempenho do relatório é resultado de um investimento do painel de dados do órgão, que se tornou mais intuitivo até para quem não atua na área e melhorou a disponibilidade de informações.
"Ter transparência e dados precisos gera externalidades positivas na elaboração de políticas públicas: pegar dados e evidência estruturados que permitem tomar decisões assertivas de, por exemplo, combate à criminalidade", afirma.
Agora, o órgão paulista pretende criar uma diretoria de segurança viária, para investir em políticas que reduzam mortes e acidentes no trânsito.
O Observatório Nacional de Segurança Viária, responsável pelo levantamento, é uma instituição sem fins lucrativos voltada a reduzir riscos e melhorar a segurança no trânsito. O grupo reúne profissionais de diferentes áreas para desenvolver pesquisas e planejar ações relacionadas com o tema. O Observatório também é uma organização consultora especial junto ao Conselho Econômico e Social da ONU.
Embora parte dos estados tenham resultados aquém do ideal, o relatório mostrou que os Detrans melhoraram os índices de transparência nos últimos anos. A nota média é de 5,78, um aumento de 16% em comparação a 2020.
"Apesar dos desafios para o avanço no conceito de transparência e dados abertos ainda serem grandes, dezenove estados evoluíram desde o último levantamento. Para nós, é muito importante continuar com esse processo de pesquisa e provocação, pois contribui para o avanço da transparência", disse Paulo Guimarães, CEO do Observatório.
Para ele os Detrans ainda pecam no acesso à informação por falta de tecnologia e infraestrutura. Essa ausência de capacidade técnica afeta até a segurança dos dados nos departamentos de trânsito, o que aumenta os riscos de vazamentos.
A consequência é a dificuldade para formular políticas voltadas à segurança viária, sobretudo em temas importantes como sinistros e infrações.
"A baixa transparência decorre de uma cultura organizacional historicamente conservadora, que por muito tempo tratou as informações públicas como sigilosas, restringindo o acesso à sociedade", diz Guimarães.
Ele afirma que, além disso, a falta de especialização em tecnologia impacta na usabilidade de sites dos departamentos de trânsito, que são pouco intuitivos e dificultam o acesso do cidadão a serviços online.
Nos estados com pior desempenho, a baixa transparência também está associada a uma menor eficiência operacional, com impacto para gestão de frotas, habilitação de motoristas e controle de infrações, segundo o CEO do Observatório.
Já nos que têm melhores resultados, os Detrans apostam em sistemas de informática avançados e conquistam melhor atendimento ao público.
Em São Paulo, por exemplo, o departamento de trânsito adotou um novo modelo de atendimento impessoal para restringir o contato entre o motorista e o profissional do órgão, tendo como um dos objetivos reduzir casos de corrupção.
Os estados mais bem avaliados no relatório contam ainda com práticas de educação no trânsito. No Espírito Santo, o Detran lançou o programa agente mirim, para ensinar sobre segurança viária nas escolas das redes municipal e estadual.
Para Guimarães, é preciso que os gestores sejam capacitados sobre a transparência, como forma de incentivá-los a investir na disponibilidade de dados.
"A transparência permite um controle social mais efetivo e tem capacidade de contribuir com o aprimoramento das políticas públicas. Esse avanço requer investimentos significativos em tecnologia e capacitação de recursos humanos."